Dizem que sou um exemplo. Concordo, principalmente em ser um exemplo do quanto devemos respeitar nossos limites, e de que não vale a pena se arriscar demais. Desde moleque sinto prazer em buscar aventura e testar meus limites. Mas isso me rendeu uma imensa lista de acidentes, pequenos ou terríveis. Machucados de ralar, esfolar, era toda semana. Eu praticava bicicross e fazia acrobacias com a bicicleta, o chamado freestyle. Não sei como minha mãe não montou uma farmácia, com a quantidade de mertiolate e band aid que eu consumia, valeria a pena.
Uma das partes do meu corpo que mais sofreu foi a canela. Na aprendizagem de manobras, o pedal insistia em escapar e acertar com tudo a canela. Já arranquei até pedaço dela. O joelho também sofreu muito. O cotovelo então... As marcas de cicatriz que tenho no corpo são "fatoriais", ou seja, são cicatrizes em cima de cicatrizes, algumas devem ter umas dez embaixo. Então vou listar só os piores acidentes.
- 1989: eu estava no auge do bicicross e cada vez mais apurado nas manobras de freestyle. Tanto que na pista de bicicross de Ouro Branco, uma das mais bem feitas de Minas na época, no último salto da pista havia uma rampa dupla, um morro mais alto seguido logo por um mais baixo, onde os ciclista "aterrissavam". Pra mim era pouco, eu saltava da menor pra maior, e ainda mandava uma manobra no ar, tirando um pé, virando o guidon ou a bike inteira. Numa dessas, me distraí e aterrissei com a bike "virada", a roda traseira pra um lado e a dianteira pra outro. A bike ficou no topo e eu desci a rampa grande de barriga, tipo avião fazendo pouso forçado. Só que havia uma pedra enterrada, só com a pontinha pra fora, e ela passou na minha barriga que nem faca na manteiga. Na hora nem vi, levantei sacudindo a poeira e, xingando a bike, fui pedalar de novo. Na primeira curva senti uma pontada. Parei e quando levantei a camisa, tava jorrando sangue de um corte de uns cinco centímetros do lado esquerdo da barriga. Mostrei pra uma amigo e o cara quase demaiou. Mandou eu ir pro hospital correndo. E eu, na inocência, falei "que nada, põe um bandeide aqui." Ele me convenceu, mas lembrei que minha mãe não estava em casa. Bati na porta da vizinha - não bastava assustar minha mãe, era a rua inteira - que quase desmaiou também, pois eu já tinha sangue até no pé. Resultado, dez pontos pra fechar o "rombo". Depois de três semanas tirei os pontos. No dia seguinte, caí de novo em cima do mesmo lugar. Cheguei no hospital e o médico - o mesmo que havia me atendido antes - recomendou pra minha mãe: "não deixa esse menino solto não!"
- 1990: eu com 16 anos, fui com amigos conhecer a piscina nova do clube da cidade. Uma piscina enorme, de uns 25 por 10, todo mundo foi pulando na água e eu, muito aparecido, resolvi de cara dar o que chamávamos de "salto olímpico" (nem sei se isso existe), esticando os braços e pernas em arco e entrando de ponta na água. Assim que mergulhei já encostei as mãos no fundo, e em milésimos de segundo consegui desviar o corpo para não bater a cabeça. Nisso virei corpo, e o braço esquerdo sobrou. Virei por cima dele, e ao sair da água, com uma dor imensa, vi que ele estava deslocado, caído ao lado do corpo. Gritei pra um amigo meu que estava na borda e pedi que ele me puxasse o braço, porque estava caído, aí ele voltou pro lugar. Correram no clube e encontraram um médico, mas já nem precisava, a luxação estava feita e o braço no lugar de novo. Detalhe, nem perguntei se a piscina era funda. Não tinha nem um metro e meio de profundidade. Mas ainda bem que não bati a cabeça, essa é uma das causa de tetraplegia, mergulho em águas rasas.
- 2000: eu morava em Viçosa e minha namorada na época em Coimbra, a 15km de Viçosa. Eu geralmente ia de carro até Coimbra com a Bike atrás pra descer a serra de São Geraldo, mas decici, um belo dia, ir de bike pra Coimbra, à tardezinha pra descer no outro dia de manhã. Saí de Viçosa no fim da tarde, já escurecendo, com uma mochila com o equipamento de trilha dentro, incluindo meu capacete. Ia numa boa, pelo acostamento, quando fiquei de pé na bike, colocando o peso no guidon e forçando ela pra baixo pra ouvir um barulho na suspensão traseira. De repente, virei com tudo pra frente, batendo o queixo e a cabeça fortemente no asfalto. Havia uma lombada no acostamento, para desviar a água da chuva, que eu não tinha visto. Como estava com o peso mais no guidon, caí de uma vez, sem chance de colocar a mão na frente. Quando levantei, jorrou sangue do meu ouvido que nem torneira, caindo na minha camisa, que era branca e ficou quase toda vermelha. Eu havia fraturado o maxilar, além de abrir um rombo no lábio inferior. Aí vem a parte engraçada. Um filho de Deus parou pra me ajudar, oferecendo-se pra me levar ao hospital. Agradeci na hora mas disse que não podia deixar a bicicleta no asfalto, pois era muito cara. O cara foi tão bacana que abriu o porta mala e enfiou a bike lá, pedindo pra mulher dele segurar a roda enquanto eu entrei no banco de trás. O fluxo de sangue tinha parado, entrei no carro na porta traseira com cuidado pra não pingar e liguei pra namorada. Falei com dificuldade, com o beiço balançando e pingando sangue, e quando desliguei e olhei pro lado estavam as duas filhas do casal, apertadinhas no canto me olhando com cara de pavor. Tadinhas, nunca mais devem ter andado de bicicleta. Além do maxilar quebrado, deu um coágulo na cabeça, o que me deixou um pouco mais retardado. Pior foi que, pra remendar o maxilar, como não dá pra engessar, os médicos colocam uma espécie de aparelho e travam com aquelas gominhas, fiquei de boca travada um mês, sem comer nada sólido, só vitaminas e caldos de canudinho. Emagreci só dois quilos!
- 2006: acidente de moto, quebrei a coluna lesando a medula no nível T2. Mas esse já contei aqui.
E tá bom né, espero ter encerrado a carreira "hospitalar" por aqui.
Menino arteiro rsss.
ResponderExcluirhei Frank!!!!! vc nao contou aqui aquela vez em que vc atravessou a cerca de arame farpado la em Viçosa......
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