Morar em república é uma experiência de vida tão importante que devia ser obrigatória, como um "ritual de passagem". A gente aprende a conviver com diferenças, a respeitar o espaço do outro (ou não), descobrimos como manter uma casa, o papel de cada um para que tudo funcione bem e aprendemos a utilizar os recursos da melhor forma possível e com orçamento limitadíssimo (eu separava bem meu dinheiro, 80% pra festas, 15% pra casa e comida e o restante pra diversos). Crescemos como pessoas e vivenciamos um test drive de como será a vida a dois, por isso somos tão bons maridos (tem que puxar sardinha pro nosso lado, claro).
Mas o que interessa aqui são as histórias. Este tema daria um blog só pra isso ou um livro, ou melhor, uma novela tipo mexicana, no estilo humor pastelão. Pensa bem: eram quatro ou cinco jovens na faixa de 18 a 20 anos, cada um fazendo uma faculdade diferente, geralmente um de cada canto do país, morando fora da casa dos pais pela primeira vez e todo mundo cheio de vontade de curtir, namorar, festejar e viver novas experiências. Cenário perfeito pra muita confusão. E alguns arranca-rabos também.
Eu dei muita sorte com repúblicas em Viçosa. De cara fui parar em uma das mais bem localizadas e com mais gente boa da cidade. Eram três de Brasília e dois de Minas. Na foto acima, em sentido horário, Paxtel (eng. alimentos), Nica(eng. civil), Eu (adm.), Varela (direito) e Negão (biologia). E eu que tirei a foto. Tinha essa mania. O prédio era no meio do calçadão, que ainda tinha aquele negócio de cidade do interior, nos finais de semana lotava à tarde, gente passeando, tomando um café ou jogando conversa fora. No andar em que morávamos tinha mais três repúblicas, uma feminina, outra masculina e uma mista, morava o irmão de uma delas lá, elas chamavam de Harém das Bulinhas. A nossa com a das Bulinhas era quase um apartamento só, as portas viviam escancaradas e gente passando de um lado pro outro o dia inteiro (e à noite também...).
Como a gente se divertia. Eram três violões na nossa república, e uma pilha daquelas revistinhas com cifras, e neguinho tentando tocar o tempo todo. Eu e Negão éramos os esportistas, eu no Mountain Bike e ele no ciclismo e atletismo. Nica era o mais musical, violão o dia todo, ensaio com banda, e tinha uma turma de RPG. Paxtel já falei aqui, mais doido impossível. O Varela era o meio termo, pé no chão, organizava as coisas, tomava frente de tudo. Ah, e nos intervalos a gente estudava. Eu acho.
Vamos às histórias. Tem tantas que nem sei por onde começar.
- Pingue pongue canino. No fim do primeiro ano da república, a mãe do Varela, de Brasília, foi nos visitar pela primeira vez. Ela chegou bem arrumada, perfumada e trazendo um daqueles mini cachorros no colo, não sei a raça, mas era do tamanho de um gato, ou melhor, de um rato bem nutrido. Ela achou tudo uma zona, sentiu falta de um monte de coisa, achou os quartos bagunçados e os colegas de república meio esquisitos. Tudo com o danado do cachorrinho no colo. Eu e Nica só vendo a cena, no quarto do Varela, e ela nos entrega o bichinho e pede gentilmente: "toma conta do meu neném pra mim que vou no banheiro". Olhei pro Nica, ele olhou pra mim com aquele projeto de cachorro nas mãos e não tivemos dúvida: vamos jogar pingue pongue com ele. Eu na cabeçeira, ele no fim da cama, e lá vai totó prum lado, totó pro outro, o bichinho tava tão assustado que nem latiu. Se é que aquilo late. Foi muito engraçado os pelinhos voando e o olho do cachorro cada vez maior. Ela voltou e eu catei o bicho na mão, acarinhando ele e falei:
"muito tranquilo esse bichinho, heim", enquanto eu sentia o coração do bicho quase pulando pra fora e os olhinhos arregalados pedindo pra mamãe "me tira daquiiiii"...
- Invasão de aniversário. Tínhamos a estranha mania de invadir o quarto da pessoa na véspera do aniversário, assim que o relógio passava de meia noite. Numa dessas, aniversário do Paxtel chegando e tava todo mundo lá em casa (todo mundo inclui as outras três repúblicas do andar e alguns visitantes). Como moço comportado que era foi dormir lá pelas dez da noite, e quando deu meia noite juntamos todos (umas quinze pessoas) na porta e "Aeeee Paxteeeel!!! Parabéeeeens!!", entramos com tudo no quarto do indivíduo. Nunca vi um susto tão engraçado, o cara pulou da cama e se juntou na cabeceira, batendo a cabeça na parede e catando o cobertor. Ah, ele dormia só de cueca e já tinha umas cinco meninas lá dentro. Passado o susto pegamos o Boiola, amigo nosso que faz aniversário no mesmo dia, tiramos a roupa dele, jogamos em cima do Paxtel e tiramos a foto abaixo, devidamente divulgada na Universidade na semana seguinte.
- Guerra de pão. Lembro também (vagamente) de um dos primeiros porres que eu tomei em Viçosa. Saí com um amigo de Vitória, cujo nome é alguma coisa parecida com Sidney, acho que era Stanley. Chegamos na república totalmente lesados e resolvemos que tinhamos que comer alguma coisa. Achei um peito de frango na geladeira e colocamos no micro-ondas. Enquanto isso encontramos um pacote de pão velho e começamos uma gerra de pão que acordou metade do prédio. Quem apareceu na sala pra ver do que se tratava levou uma "pãozada" na orelha (e deve ter doído, porque o pão tava duro que nem pedra). Pronto, teve início a guerra de pão. Neguinho se escondendo atrás da porta da geladeira aberta, atrás da mesa, veio gente da outra república com mais pão e virou um "pãodemônio". Imgainem como ficou o chão depois disso.
Quanto ao frango, o micro-ondas apitou e o Stanley simplesmente pegou com a mão e colocou em cima da mesa. Eu perguntei "não tá quente não?" e o cara "não sei, não tô sentindo nada". No outro dia, a mão vermelha que ele ficou confirmou minha suspeita.
Caramba, tem muito mais coisa engraçada. Muita coisa só quem viveu acha engraçado, mas está sendo bom desenterrar essas histórias!
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